18 de jun. de 2012

Timothy e minha tentativa frustrada.


- Timothy, onde você estava?
Sempre a mesma pergunta; e ele continuava com o jogo, dando sempre a mesma resposta… O silêncio. A moça perdurava-se em linhas tênues, oras passando as mãos entre os finos fios de cabelo, penteando-os para traz, preenchendo a sua face de alguns sinais de preocupação. Já não se lembrava de como comunicar com tal silêncio, era tão frustrante, amargo, impetuoso… Talvez até esperado e compreendido, um pouco veemente; mas o fato é de que em tamanho silêncio, não era possível de ser ler algo; nenhuma ou qualquer informação poderia ser obtida de tal, e isso a deixava com enorme angustia; e com as palavras engasgadas na garganta flagelada, ela se dispunha a sacrificar-se e perguntar-lhe mais uma única vez – Timothy, onde você estava? – e o silêncio vinha lhe acompanhar novamente. Então, começava a desenrolar em sua mente algumas possibilidades, que não lhe pareciam tão prováveis, mas, vindo a ser ações de Timothy não podia se descartar nenhuma e qualquer hipótese.
Ele era total e completamente irresponsável; má influência, má companhia, quase não falava, era quieto, mas era perceptível o alto nível de raiva e amargura que se comprimiam dentro de seu peito. Deveria estar por ai, meio por ali. Se metendo em briga, arranjando confusão. E por qual motivo? Nenhum. Bem, talvez um.
Existia um único fato passado que havia lhe perturbado por um tempo. Digo por um tempo porque Timothy insiste em dizer que hoje ele já não se importa tanto com o que aconteceu; diz que se acostumou com as perdas, com as mortes, com a ausência dos pais; diz que eles não fazem tanta diferença porque nunca conseguiram passar mais de meia hora juntos. Pais ocupados, trabalhadores… Não tinham tempo para os filhos. Diz que tem a irmã e isso já lhe basta. Já lhe é o suficiente. Mas isso são apenas mentiras que ele escrevinha na tentativa de mandar a dor e saudade para bem longe, o que ás vezes consegue, mas logo volta a deprimir-se e sair à procura de qualquer coisa que possa tornar-lhe ocupado, e sem tempo para sentir qualquer sentimento além da frieza.
E acho que no fundo, ele tem lá um pouco de razão.
Ele levantou a face e deixou transparecer o ar sarcástico. Guiado pela desarmonia, Timothy jogou-se do balcão num ato violento, e atravessou a cozinha em passos lentos, curtos e grosseiros. Subiu as escadas o mais devagar possível e ao entrar em seu quarto fez enorme questão de bater a porta. A moça dos olhos de jabuticaba pôs-se a derramar inúmeras e infinitas lágrimas… Molhou a branquíssima pele com seus pesares… “E pensar que alguns anos atrás tudo era mais fácil” – era tudo o que conseguia pensar. Não gostava dessa rebeldia do irmão, mas sabia muito bem quais eram os motivos para tal, então ela apenas aceitava… Na esperança de que algum dia Timothy compreende-se o que de fato estava acontecendo.
Louise era moça jovem. Dos seus vinte anos vividos, metade passara cuidando do irmão. Não estudara, mas conhecia muito bem os dilemas da vida. Sofria. E como sofria. Mas não era um sofrimento por causa dos clichês de amores não correspondidos. Achava que eles não existiam, e que foram inventados apenas como uma desculpa para quem não sabe o que fazer da vida e brincava de sofrer. Ela sofria pra valer. De levar pancada, cair no chão e não ter forças para levantar. A vida era injusta, mas não reclamava, pois acreditava que tudo acontece por algum motivo e para nos ensinar alguma lição.
Timothy passou o dia inteiro trancafiado no quarto. Não comeu nada. Não bebeu nada. Não ouvia nem a sua preciosa música. Apenas ficou deitado na cama e de hora em hora ia até a janela, mas logo retornava a deitar-se. Louise tentou chamá-lo algumas vezes para almoçar, mas ficou sem resposta, o que a levou a desistir de tentar qualquer diálogo com o irmão.
As semanas seguintes tiveram a mesma rotina. Mas como modo de sobrevivência Timothy passou a beliscar alguns pedaços de pão aqui e tomar alguns goles de café ali. Havia tirado alguns cochilos. 20 minutos ao máximo, para que não perdesse a hora e pudesse repousar seus cotovelos por cinco minutos na janela. Então, quando a garota da padaria passava, ele a olhava e torcia o pescoço para poder vê-la já longe. Até que ela virava a esquina e ele a perdia de vista. E assim foi por um longo tempo. Até que ele se cansou.
Não entendia por qual motivo fazia aquilo. Ela era apenas uma garota. Bem, não era uma garota, era A garota. Cabelos escuros e levemente encaracolados, cortados de forma desfiada um pouco abaixo dos ombros; tinha expressões felizes, olhos sinceros e um tanto quanto incertos. Não poderia se adivinhar nela qualquer sentimento além da felicidade. Mas aqueles que a conheciam de verdade – contam-se nos dedos quantos eram – sabiam o quanto de amargura se escondia dentro dela.
Mas como Timothy de nada sabia, achava que ela estava feliz, e como dizem “se melhorar estraga” preferiu não tentar melhorar nada. E mesmo que quisesse, não sabia como fazer. Nada sabia fazer a não ser fumar alguns tragos de cigarro, beber alguns – muitos – goles de qualquer bebida que ele visse a sua frente, cantarolar junto ao som de Jet, andar pela cidade sem destino nenhum e, bem, sabia também admirar a garota da padaria, mas isso não importava. Não mais. Talvez apenas por enquanto.
Já era noite de 23 de novembro quando Timothy decidiu deixar o quarto e vagar por aí. Foi até a casa de Mark, e como de costume encontrou lá uma festa para se embebedar, perder todos os sentidos e o controle sobre si mesmo. Não se importava com as conseqüências e muito menos para as dores que elas pudessem causar. Foi entrando, não precisava sem convidado, já era de casa. E mesmo que não fosse não faria diferença nenhuma.
– Timothy, você por aqui? – Mark gritou de cima da escada e saiu correndo para cumprimentar o amigo. – O que aconteceu cara? Você sumiu? Eu te procurei por ai, não te achei em lugar nenhum.
– Você por acaso me procurou em casa? – perguntou, mesmo não dando muita atenção ao que Mark falava.
– Cara, você nunca fica na sua casa, que eu até esqueci que você tinha uma. E mesmo que eu fosse até lá, aquela sua irmã não iria me deixar entrar.
– É tanto faz. – e saiu andando pela casa pequena que estava lotada de pessoas dançando ao som de uma música barulhenta e que o incomodava intensamente. Não que não gostasse desse tipo de música, muito pelo contrário. O que não suportava eram as pessoas. Todas querendo parecer um pouco mais legal e interessante. Falsas e sem personalidade nenhuma.
Subiu as escadas. Deu uma olhada ao redor do segundo andar. Nada interessante. Desceu. Deu mais de uma volta pelos cômodos. Nenhuma garota de padaria se encontrava por ali. Percebeu que estava insistindo no mesmo assunto novamente. Maldita garota da padaria. Terminou a bebida e foi embora para aquele lugar que costumam chamar de casa.
Já fazia alguns meses que nada acontecia na vida de Timothy. Quer dizer, havia alguns novos machucados, alguns arranhões e uns pares de cicatrizes, já que a única atividade que praticava era andar de skate até que a noite surgisse e ele não precisasse reconhecer as pessoas que ficavam o encarando. Não estava mais a fim de ficar com raiva daqueles desocupados que ficavam o olhando como se fosse um prêmio. Não que ele fosse maravilhosamente bonito, isso também, mas algo nele o tornara diferente de tantos outros que rondam por aí, e era justamente isso que o incomodava. Ser tachado de diferente, de esquisito e extremamente julgado pela sociedade. E depois poderia ia para casa. Se é que ele poderia chamar de casa. Vivia em um grande sobrado junto com as duas irmãs – Louise e Noelle – com os tios – Larry e Charlotte – e com o filho deles, Lucas. Não conseguia chamar de casa um lugar que não tinha a presença de seus pais, mas o fazia por falta de outra denominação para tal. Não suportava a idéia de ter que dividir um teto com o primo. Sujeitinho arrogante e inapropriado era aquele Lucas. Não que ele não fosse um pouco – muito – assim também, mas na sua filosofia de vida só ele poderia ser o sujeito errado da história.

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